quarta-feira, 2 de novembro de 2011


ANÍBAL MACHADO, UM ESCRITOR MULTIFORME

Para muitos, ele ainda é lembrado como o pai da escritora Maria Clara Machado, a maior expressão do teatro infantil brasileiro. Outros recordarão das famosas reuniões literárias em sua casa na Zona Sul do Rio de Janeiro; Aníbal, o amigo dos escritores amigos, o mineiro que recebia a nata da literatura em sua residência.
Mas quantos Aníbais ainda podemos inferir de sua vasta,variada e diferenciada literatura! Aníbal não explorou o árido terreno do romance, mas consagrou-se na área do conto - é um dos maiores contistas brasileiros, sem dúvida. A Morte da Porta-Estandarte, Tati, a Garota e Viagem aos Seios de Duília, histórias que todos amam ainda, além de consagradas pelo tempo, ganharam respeitáveis adaptações para o cinema.
Sobre Viagem aos Seios de Duília, é importante ressaltar que se trata de um dos contos mais discutidos pela crítica literária. É um daqueles contos que extrapolam sua própria natureza. Como O Alienista, de Machado de Assis, ultrapassa o padrão básico de 15 páginas estabelecido para um conto, aproximando-se mais do formato de uma noveleta, quase um romance.
As personagens de Aníbal, como o atarantado cidadão de outro conto clássico seu, O Piano, como o José Maria de Viagem..., como os trágicos carnavalescos de A Morte da Porta-Estandarte, trazem em si o apequenamento do cidadão comum, do homem na multidão. São retratos do cidadão carioca do subúrbio, sofrido, sonhador, em luta contra seu destino. Neste sentido Aníbal escreve na mesma linha de Marques Rebêlo, Lima Barreto, e João Antônio. Como o João Brandão, criação de outro mineiro sediado no Rio: Carlos Drummond de Andrade...
Além de contista, Aníbal escreveu historietas a que não podemos chamar propriamente de romance: são um misto de prosa, poesia, crônica e reflexões: Vila Feliz, seu livro de estréia, Cadernos de João e João Ternura. Nestes dois últimos são apresentados ao público sua personagem mais famosa.
Há ainda o Aníbal criador de uma faceta única na literatura brasileira. Como caracterizar ABC das Catástrofes e Topografia da Insônia? Mais uma vez a conjunção prosa/lirismo aparece aqui de uma forma mais aguda, para explanar a perplexidade do autor diante de dois dramas cotidianos do ser humano.:Os salvados do incêndio e os insones..... É a crônica dos desajustados:


"Conquanto não seja decente sair sem um arranhão de qualquer desastre, a alegria de quem escapa é proporcional ao número dos que morreram. Essa alegria passa depois a sentimento de orgulho - pela natural tendência do indivíduo a se atribuir poderes mágicos."

(ABC DAS CATÁSTROFES)


"Parece que dormi. Parece. Mas foi um sono falso, de imitação: a prova é que tudo que existe de pior no estado de vigília aproveitou também a ambulância da noite e embarcou comigo."

(TOPOGRAFIA DA INSÔNIA)

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