segunda-feira, 16 de maio de 2011


POEMA DO DIA

VELHAS PAIXÕES, NOVOS AMORES

MARTINS FONTES













Quanta estrela haverá, dentro da imensidade,
Que há muito se apagou, mas o olhar acredita,
Vendo a noite esplender a sua luz bendita,
Que ainda vive e conserva a mesma claridade?

Quantas velhas paixões, mortas na mocidade,
Guardam esse fulgor, que no espaço palpita,
- E há séculos percorre a amplidão infinita,
E é, na amplidão do amor, como a nossa saudade?

Quanta estrela haverá, no céu negro e tristonho,
Cujo clarão caminha entre as sombras escuras,
Simbolizando o amor no mistério do sonho?

Um dia há de brilhar essa luz nas alturas...
- E as paixões que hei de ter, e apenas pressuponho,
Ardem dentro de mim, como estrelas futuras!


domingo, 15 de maio de 2011


RESENHANDO

CINCO MINUTOS

JOSÉ DE ALENCAR

Podia dar-lhe outra resposta mais breve, e dizer-lhe simplesmente que tudo isto sucedeu porque me atrasei cinco minutos.

Desta pequena causa, desse grão de areia, nasceu a minha felicidade; dele podia resultar a minha desgraça. se tivesse sido pontual como um inglês, não teria tido uma paixão nem feito uma viagem; mas ainda hoje estaria perdendo o meu tempo a passear pela rua do Ouvidor e a ouvir falar de política e teatro.

Isto prova que a pontualidade é uma excelente virtude para uma máquina; mas um grave defeito para um homem.

O leitor desavisado pode vir a julgar o trecho acima como saído da pena de Machado de Assis, tal as semelhanças sintáticas, tal a postura eminentemente reflexiva, tal a fina ironia.

Pois assim é o primeiro romance de José de Alencar, Cinco Minutos, publicado inicialmente em folhetins em 1857. Eclipsado pelo estrondoso sucesso de O Guarani, lançado no mesmo ano, e pelos romances subsequentes, é um romance injustiçado e mesmo deixado de lado um pouco pelos críticos em geral.

Trata-se, porém de um romance originalíssimo em sua concepção. Ainda sem a grandiloquência dos romances indianistas de Alencar (O Guarani, Iracema), sem o moralismo tortuoso de seus romances femininos (Lucíola, Diva) e sem o palavreado um tanto forçoso dos romances urbanos (A Pata da Gazela, Senhora), apresenta ao leitor uma história leve, fugaz - e breve. A brevidade é o mote do livro, o tempo é a personagem principal, como em Proust. É uma rapsódia, um livro curto que se casa com a narrativa seguinte, A Viuvinha.

Notável o bom humor de Alencar, aquele mesmo bom humor predominante emA Pata da Gazela, ainda longe da militância política e das amarguras sociais dos anos à frente. Por todo o livro se pressente a sombra de Machado; reflexão e ironia, até mesmo o sarcasmo, coisa rara em Alencar são encontrados na narrativa:

Mais uma prova! Uma mulher bonita deixa-se admirar, e não se esconde como uma pérola dentro da sua ostra.

Decididamente era feia, enormemente feia!

Assim como em Machado, surgem as teorias:

Não se admire, minha prima; tenho uma teoria a respeito dos perfumes.

A mulher é uma flor que se estuda, como a flor do campo, pelas suas cores, pelas suas folhas e sobretudo pelo seu perfume.

Dada a cor predileta de uma mulher desconhecida, o seu modo de trajar e o seu perfume favorito, vou descobrir com a mesma exatidão de um problema algébrico se ela é bonita ou feia.

Cinco Minutos é um romance com um mínimo de personagens, com poucos diálogos, longos trechos entre aspas, dando a idéia de uma confidência ou de um sussurro. Narra a aventura de um conquistador à procura da mulher misteriosa, a embuçada, como nos típicos romances franceses da época. Como pano de fundo, lindíssimas descrições pictóricas da paisagem carioca e fluminense. O mar, presença dominante, acompanha o narrador/personagem em sua busca frenética por toda a narrativa.