sábado, 30 de outubro de 2010



POEMA DO DIA

HÃO DE CHORAR POR ELA OS CINAMOMOS...

(ALPHONSUS DE GUIMARAENS)


Hão de chorar por ela os cinamomos,
Murchando as flores ao tombar do dia.
Dos laranjais hão de cair os pomos,
Lembrando-se daquela que os colhia.

As estrelas dirão: - "Ai! nada somos,
Pois ela se morreu, silente e fria..."
E pondo os olhos nela como pomos,
Hão de chorar a irmã que lhes sorria.

A lua, que lhe foi mãe carinhosa,
Que a viu nascer e amar, há de envolvê-la
Entre lírios e pétalas de rosa.

Os meus sonhos de amor serão defuntos...
E os arcanjos dirão no azul ao vê-la,
Pensando em mim: - "Por que não vieram juntos?"


sexta-feira, 29 de outubro de 2010


RESENHANDO

À BEIRA DO TEU CORPO


Entre Eros e Tanathos, pulsão de vida e pulsão de morte, os gregos criaram os extremos da arte poética: a Ode e a Elegia.
A Ode, gênero clássico de verso mais livre, amplamente empregado tanto no período Clássico como no Romantismo, é uma poesia para louvar os feitos heróicos ou para cultuar grandes vultos históricos ou políticos. Já a Elegia, menos comum, é um canto fúnebre, onde se carpe o herói ou a presença querida que partiu.
A poesia brasileira registra notáveis exemplos de elegia, como A Meu Pai Morto, de Augusto dos Anjos, Cântico do Calvário, de Fagundes Varela (dedicado a seu filho Emiliano, morto aos 11 anos de idade), além do belíssimo A Carolina, de Machado de Assis.
O poeta goiano Afonso Félix de Sousa (1925-2002), um dos mais sensíveis representantes da Geração de 45, nos legou este tocante À Beira do teu Corpo, um acerto de contas com o filho morto, poemas de extrema beleza. Transcrevemos aqui o poema-título:


À beira do teu corpo

I

À beira de teu corpo eu busco, e alcanço-a, e agarrro-a,
a mão que, de onde estás, já não me estendes, a mão
que em criança, com toda a confiança, me estendias.

E então, de mãos dadas, saíamos pelo mundo
com que te deslumbravas e eu ia aos poucos
tentando explicar, a ti que o contemplavas
com os olhos arregalados, e o colorias
a teu modo, com tintas próprias, e te soltavas
de mim, e nele mergulhavas, e dele me estendias
de novo a mão como se quisesses conduzir-me
para o avesso de mim, ou para a fuga
de um mundo que nos deslumbra e se desdobra
em paisagens de dor, quando explicado.





domingo, 24 de outubro de 2010



POEMA DO DIA

ÁGUA CORRENTE

(OLEGÁRIO MARIANO)

Água corrente! Água de um rio quieto
cortando a alma ignorada do sertão!
Levas à tona, aspecto por aspecto,
os aspectos da vida em refração.

Água que passa...Sonho predileto
do campônio que lavra o duro chão,
trazes-me sempre a evocação de um teto...
Água! Sangue da Terra! Religião...

Há na tua bondade humana e leal,
quando a roda maior moves do Engenho,
qualquer bafejo sobrenatural...

Ouvindo, ao longe, o teu magoado som,
água corrente! eu me enterneço e tenho
uma imensa vontade de ser bom...

VARGAS LLOSA, ENFIM O RECONHECIMENTO


O mundo da Literatura acordou mais feliz no dia 7 de outubro. Depois de muitas nominações enfim a Academia Sueca premiou o escritor peruano Mario Vargas Llosa com o Prêmio Nobel de Literatura 2010. Foi um reconhecimento demorado e tardio, mas justo, embora cercado de uma certa polêmica pela atual posição política do agora laureado autor de Conversa na Catedral, Tia Júlia e o Escrevinhador e A Guerra do Fim do Mundo.

Vargas Llosa, que já foi ídolo da esquerda ao lado do outro grande nome da literatura hispano-americana, Gabriel Garcia Márquez, é visto agora com olhos críticos que parecem esquecer que, em Literatura não há direita nem esquerda - há apenas Literatura. Há mesmo escritores assumidamente fascistas como Louis-Ferdinand Céline, Montherlant e Péguy cujos escritos são amplamente estudados e discutidos, considerados mesmo como de grande qualidade.

É curioso como o Peru, sendo uma nação tão diminuta, tenha produzido uma literatura tão excelente e tão diversificada. A Argentina de Borges, Bioy Casares e Julio Cortázar e o México de Octavio Paz e Amado Nervo são os países hispano-americanos com maior representatividade. A Colômbia nos deu Garcia Márquez, do Chile vieram Pablo Neruda e Gabriela Mistral, outra laureada com o Nobel de Literatura. A Nicarágua é a pátria de Ruben Dario, a excelência da poesia latino-americana.

Ora, além do agora laureado Vargas Llosa, os peruanos devem orgulhar-se, e muito, da literatura de Manuel Scorza e este excelente Garabombo, o Invisível. Ainda temos Ricardo Palma e suas Tradições Peruanas, o discutidíssimo Horacio Quiroga e o curioso Sofocleto com seu anedotário de nome Sinlogismos.



terça-feira, 12 de outubro de 2010



POEMA DO DIA

ESPUMAS DO MAR...

(MANUEL BANDEIRA)


O rei atirou
Seu anel ao mar
E disse às sereias:
- Ide-o lá buscar
Que se não o trouxerdes,
Virareis espuma
Das ondas do mar!

Foram as sereias,
Não tardou voltaram
Com o perdido anel.
Maldito o capricho
De um rei tão cruel!

O rei atirou
Grãos de arroz ao mar
E disse às sereias:
- Ide-os lá buscar
Que se não o trouxerdes
Virareis espuma
Das ondas do mar!

Foram as sereias,
Não tardou, voltaram,
Não faltava nem um grão.
Maldito o capricho
Do meu coração!

O rei atirou
Sua filha ao mar
E disse às sereias:
- Ide-a lá buscar,
Que se não a trouxerdes,
Virareis espuma
Das ondas do mar!

Foram as sereias...
Quem as viu voltar?
Não voltaram nunca!
Viraram espuma
Das ondas do mar.