O ACORDO ORTOGRÁFICO – QUANTO VALE ESTA MOEDA?
Por estes dias reuniu-se na Câmara do Senado a Comissão de Educação, Cultura e Esporte (por que tanta coisa junta numa mesma pasta???) para tratar da possível revisão do Acordo Ortográfico Brasileiro (sim, brasileiro mesmo porque até agora a comunidade dos países lusófonos não mexeu um centímetro sequer na intenção de ratificar este polêmico purgante que nos foi enfiado goela abaixo pelo atual Governo, na esperança de conquistar possíveis simpatias internacionais e aumentar a aura de bonachão do Presidente).
Liderada pela Senadora Marisa Serrano, veterana e conhecida professora de Português, o interessante debate contou ainda em sua bancada com o Professor Ernani Terra, outro nome bastante familiar a todos os que militamos na docência da Língua e da Literatura Brasileira, e com o filólogo Leodegário de Azevedo Amarante Filho, Presidente da Academia Brasileira de Filologia.Esteve presente ainda o Senador Cristovam Buarque.
O clima, obviamente era de oposição e de crítica ao Acordo. Mas o mais interessante foi ver o Professor Leodegário, a quem de direito deveria ser a consulta e a decisão sobre este Acordo espúrio, mercantilista e oportunista, queixar-se de não ter sido a Academia de Filologia sequer consultada. O eminente filólogo deixou claro sua mal-querença com o referido Acordo.
Ora, o professor Leodegário não é pouca coisa; além de Presidente do órgão que tem mais trato com a Lingüística e a Filologia do que a Academia Brasileira de Letras, é o maior especialista em Camões, tanto no Brasil como em Portugal, respeitadíssimo nos dois países. Ele, com uma vida inteira de intenso trânsito entre Brasil e Portugal, melhor do que ninguém conhece as diferenças culturais entre o Brasil e os países signatários do Acordo.
E o Mestre, do alto dos seus 80 anos, fez jus à sua longa carreira e á sua reputação cultural: até agora, até onde eu o saiba, foi o único alto representante da Língua Portuguesa – aqui incluídos filólogos, gramáticos, lingüistas, acadêmicos, professores educadores e docentes - a se opor veementemente ao Acordo. A grande maioria – não é de bom tom citar nomes – vendeu-se para um pouco de fama, com direito a sucessivas entrevistas nas revistas especializadas e programas de televisão, unindo-se aos professores-marqueteiros-teleapresentadores, cujas verdades se resumem a esta, por exemplo: “Eu não concordo muito com o Acordo, mas pra mim ele vai ser ótimo, porque eu vou passar o resto da vida dando palestras sobre isto.” Sem comentários.
Acredito que o Professor Antônio Houaiss, autor e condutor da trajetória do Acordo Ortográfico, tinha boas intenções em relação ao seu projeto original. Doze anos depois de sua morte, o Acordo virou moeda para qualquer coisa espúria.
Quanto à Academia Brasileira de Letras, infelizmente temos que mais uma vez repetir a já clássica boutade de Luís Fernando Veríssimo:
“Aquela sombria gravidade que a gente nota nas fotografias em grupo dos membros da Academia Brasileira de Letras é de reprovação pelo Português ainda estar vivo.”